Publicado em 14/10/2025, às 10h05.

Antonio Rocha.
Possui graduação em Filosofia pela PUC Goiás, graduação em Direito, Licenciatura em História, Curso Seminaristico de Filosofia pelo Instituto de Filosofia/teologia de Goiás, Curso livre em Teologia (1993), especialização em Filosofia Clínica, e mestrado em Ciências da Religião pela PUC Goiás. Ex- Professor efetivo da PUC Goiás, foi professor convidado do Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás.

SEU SIRIACO, O MEEIRO DO PADRE.

O ensaio de hoje homenageia uma das figuras mais notáveis e bem humoradas da cidade, Sirilo Severo dos Anjos. Ignorando o seu nome de batismo, todos na cidade o tratavam como “Siriaco” do Padre André. Com sua esposa Dona Dió (Diolina Maria da Conceição), formaram uma numerosa prole de nove filhos e filhas. Embora tenha nascido no Brejo dos Aflitos, município de Correntina, Siriaco correu trecho até se estabelecer em Correntina. Antes, este valente guerreiro perambulou por vários lugares da região, hora vendendo mão-de-obra a uns, hora trabalhando de meeiro para os fazendeiros da redondeza, pois jamais possuiu um metro de chão.

Foto de Siriaco e sua esposa Dona Dió.

Vivendo da profissão de lavrar a terra, Siriaco teve como primeiro patrão um senhor conhecido por Zé, com quem trabalhou por mais de uma década. Posteriormente laborou com Vitorino, na Fazenda Taboa e em seguida, no povoado de Cerco. Contudo, foi na fazenda pertencente à Paróquia Nossa Senhora da Glória, que o novo colaborador do Padre fez sua longa estadia. Ali ele viria a se tornar meeiro do Vigário Pe. André Bérénos e seu parceiro na produção de grãos. Com o Padre, Siriaco laborou por 21 anos a fio, cultivando roça, formando pastagens e criando gado. Enquanto isso, sua esposa cultivava horta nos quintais do Reverendo. Assim é que a família desse abnegado camponês foi conquistando a inteira confiança do “homem de Deus”, auxiliando-o nas demandas da administração paroquial. Quer na lavoura, na culinária, nos arranjos da casa ou nas lavanderias da residência do sacerdote, a família de Siriaco era presença assídua. Plantavam, colhiam e dividiam os frutos da colheita, conforme critérios verbalmente acordados. Quando a lavoura fracassava-se, o único saldo positivo era a pastagem da fazenda. Restava ao meeiro rezar e esperar que o ano seguinte não fosse castigado pela cruel estiagem.

Foto: Residência de Siriaco.

Mas o nosso homenageado nunca foi de baixar a cabeça e desistir. A família inteira se virava, como podia, vendendo dias de trabalho aos outros, para não deixar faltar o alimento. Enquanto os homens roçavam pastos e carpiam o chão, as mulheres quaravam, lavavam e passavam roupas de quase todos da cidade, inclusive as peças da casa paroquial. Fato é que a cidade não se cansou de contemplar a procissão das lavadeiras, filhas de Dió e Siriaco: Gregória, Lindaura, Maria, Francisca e Isabel. Elas desciam e subiam a ladeira com malas de roupas equilibradas na cabeça, com o fito de atender às demandas do Hotel de Vivi e de outros domicílios. Quanto ao roçado, localizava-se na vazante da fazenda da Mitra Diocesana, onde a família de Seu Sirico plantava e colhia o arroz, o feijão e o milho. Foi dessa forma e com essa luta que Siríaco, adjutorado pela família, construiu a própria casa no alto do Cemitério velho, que hoje pertence aos herdeiros remanescentes. E lá vão-se 62 anos de aquisição do imóvel, lar que ainda permanece perfeito, distribuindo o mesmo afeto, a mesma acolhida e o mesmo aconchego.

Foto: Utensílios utilizados por Siriaco.

Não fugindo à regra do contexto da época, no quesito sobrevivência, além de lavrador, Siriaco também foi oleiro. O próprio trabalhou na olaria, fabricando telhas e tijolos para construir sua casa. Mas, com o peso da idade e cansado, Siriaco partiu para a Eternidade Celestial, sem ter possuido uma gleba de terra sequer. Desfeita a fazenda do padre, os filhos do memorável camponês felizmente conseguiram adquirir, com moeda corrente, uma pequena gleba de 20 hectares, nas terras outrora pertencentes à Mitra. Ali puderam plantar, criar e garantir algum meio de sobrevivência. Vale lembrar que a família de Siríaco é, rigorosamente falando, exemplo de retidão, de perseverança, de dignidade e elevado valor moral. De ascendência negra, todos os seus membros transmitiram, às gerações e à cidade como um todo, admiráveis hábitos de convivência.

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