Publicado em 24/02/2025 às 09h16.
Por Antonio Rocha: A MESTRA DONA SIAANA
O presente artigo objetiva resgatar a história de uma notável figura, que se notabilizou por despertar e desenvolver potencialidades latentes em crianças e adolescentes de Correntina. A figura em destaque era uma professora que atendia pelo nome de Sianna.
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Seu nome completo era Anna Neves de Oliveira e, desde cedo, dedicou-se à arte de conduzir e ensinar, fazendo jus ao conceito elementar da pedagogia. Uma senhora de pele branca, estatura mediana, olhos castanhos e profundos, cuja retração se tornava mais nítida ao fitar as pessoas.
A cidade a conhecia como professora Sianna, mas não se sabe a razão deste cognome. Independentemente da ausência de melhores informações, foi assim que Sianna ficou conhecida na cidade, até o fim de seus dias. Recordo-me do seu xale preto, entrecruzado sobre a cabeça e estendido por toda a extensão dos membros superiores.
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Era assim que ela caracterizava, exatamente como fazia toda e qualquer bela dama do lugar. Ao desfilar-se pela cidade, era reverenciada e aclamada por todos, homens e mulheres, jovens e crianças. Desse modo, ia cumprimentando a todos com educação e fina elegância.
Conheci a professora Sianna quando viúva, já com uma idade relativamente evoluída. Na época, pude observar bem sua postura e seu charme, ao tocar o seu violão, cantarolando algumas canções. Diga-se de passagem, uma arte reservada a poucos, na ocasião, principalmente em si tratando de mulher. Outro hábito de Sianna, que presenciei reiteradas vezes, foi o uso do cachimbo e suas belas baforadas, que faziam a branca fumaça subir pelo ar, à moda das damas que postulam autonomia. O seu gesto subversivo fez-me intuir Simone de Beauvoir.
Sianna foi, sem sombra de dúvidas, uma das grandes educadoras que Correntina já conheceu. Na exata proporção das que fizeram do seu próprio lar um centro de ensino de letras e humanidades.
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Fez isto com o fito de bem definir o destino dos educandos que freqüentavam a sua casa-escola. Naquela escola não havia distinção entre ricos e pobres, pretos e brancos, embora a mestra Sianna freqüentasse as altas rodas socais do lugar. Os remanescentes ainda se recordam de quando aquela bela criatura desfilava com o seu lindo cabelo grisalho, contrastando-se com o seu “negro” xale estendido sobre os ombros.
A professora Sianna nunca saía de casa sem se produzir, tampouco dava aulas sem uma prévia produção visual. E assim ia alfabetizando e fincando os alicerces da construção formativa de seus alunos. Ela encaminhou os jovens ao itinerário das altas posições do saber, com vistas a atingir o vértice da pirâmide social. Pacienciosa e persistente, Sianna nunca desistia de qualquer aluno, por mais difícil que fosse e por mais rude que se apresentasse. Estava ali, na simetria, priorizando, estimulando e dialogando com estudantes e pais.
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Sua habilidade didático-pedagógica era inata e ao que me consta, nunca teria saído de Correntina para se dedicar a estudos superiores fora do município. Pelo contrário, foi ali mesmo, no sertão de meu deus, na dureza do torrão e na aridez das possibilidades, que Anna Oliveira foi lapidando-se, inventando, experimentando e aplicando os seus próprios métodos, para alavancar a aprendizagem. Igualmente, não há registro de um só aluno que saísse das suas aulas sem que soubesse ler, escrever e conhecer as quatro operações matemáticas. Essas são as habilidades indispensáveis para o sucesso profissional de qualquer estudante, de ontem e de hoje.
Por isso é que a mestra Sianna figura-se como uma das pessoas que merecem menção honrosa, tanto do poder público como de toda a sociedade correntinense. Seu relevante papel, no âmbito da educação, é inestimável, sobretudo no tocante à formação inicial dos nossos estudantes.
Sianna tinha sempre junto a si um ABC, uma Tabuada e uma Palmatória, instrumento de castigar, do qual raramente fazia uso. Por fim, depois de ter cumprido sua missão e sua trajetória profissional, Sianna exilou-se do mundo, deixando-nos como legado as bases de um saber que se constitui num guia e numa luz para os caminhos das novas gerações.
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