Publicado em 02/12/2024 às 17h24

Foto – Grupo relíquias de Correntina (facebook)

Por Antonio Rocha – BR 349: ENTRE O AMOR E O PAVOR.

Uma cidade de gente ordeira e boa vizinhança, onde quase todos se conheciam e se cumprimentavam pelo nome. Ali, as pessoas viviam uma realidade quase que atemporal. Os ponteiros do relógio corriam devagar, enquanto o dia e a noite faziam-se intermináveis. Os moradores, em seus colóquios, orgulhavam-se de suas grandes conquistas: uma pequena Hidrelétrica ali, uma modesta Usina de Beneficiar algodão acolá, e uma Estrada de chão que ligava aquele pequeno lugarejo à capital federal.

Foto – Grupo relíquias de Correntina (facebook)

Todos falavam com exaltação e peito inflado, daquela preciosa Jóia. O mérito dela era fazer a cidade ser reconhecida, visitada, valorizada e apreciada pelos visitantes. Sem ela, todos os moradores seriam meros anônimos perdidos em algum ponto do cerrado. Há ali, ainda hoje, o marco do registro de nascimento da velha estrada de rodagem, datado dos anos 60. Um feito festejado à época, do modo como se festeja a chegada de um bebê no seio de uma família extasiada.

Foto – Grupo relíquias de Correntina (facebook)

Era, pois, uma estrada vagarosa, lenta e pesada, tanto que, quem por ela se deixasse conduzir, tinha o tempo suficiente para contemplar o azul do céu, o verde do mato, os bichos e as veredas. Seu chão era, ora tingido de branco refletindo a luz do luar, ora marrom refletindo os minerais da terra. O fato é que todos estavam satisfeitos com a estrada de índole mansa, calma, inofensiva, amiga dos passantes; Crianças e adultos; sábios e matutos; camponeses e citadinos. Todos deixavam guiar-se por ela sem pressa, de maneira segura e confiante.

Foto – Grupo relíquias de Correntina (facebook)

Mas, um dia… desses que a gente não sabe bem o porquê, os habitantes da cidade dormiram e sonharam com o progresso, encantados com tudo o que viram na televisão. Contaminados com a idéia de civilização, passaram então a botar defeito na lenta e velha estrada, desfazendo de seus atributos e do seu gênio pacífico. Exigiram, com arroubos e gritos, que ela se tornasse mais ligeira e adequada aos moldes modernos.

Foto – parada da Velha da Galinha (Gerais) Crédito do grupo Relíquia de Correntina (facebook)

Foi então que decidiram vestir a antiga estrada com uma manta preta por sobre as costas, dando-lhe o nome de asfalto. Pois aprenderam na televisão que só assim a velha estrada ficaria moderna e veloz, tornando-se mais eficiente. Inauguraram e rebatizaram-na. A população, frenética, soltava fogos de artifício, dando vivas com efusão. A cidade inteira, feliz vivia o frenesi do progresso, que porventura ali havia chegado. O tempo corria e a estrada revestida de manta preta ia ficando cada vez mais veloz.
Entretanto, o progresso tem seus percalços e desencantos. Apesar de toda aquela euforia do passado, dos sonhos de conforto e de bem estar acalentados, a dor e a desilusão golpearam os moradores bem mais cedo que o esperado. A cidade viu, com tristeza, multiplicar o número de mães que choravam a perda de seus filhos e o aumento do número de viúvas chorando seus maridos mortos. Famílias inteiras desintegradas, laços de amizade rompidos, e até rebanhos dizimados por conta da alta velocidade habitualmente desenvolvida.

Foto – parada da Velha da Galinha (Gerais) Crédito do grupo Relíquia de Correntina (facebook)

Aquela estrada pacifica e lenta já não era mais a mesma! Começando a correr ligeiro, ligeiramente teve vidas ceifadas. Mas ela… ela mesma, coitada, não tinha culpa! Não cometera crime algum. Fizeram-na assim! Por fim, os filhos da terra começaram a ter medo e pavor de sua própria recriação.

Posto da Polícia Rodoviária Federal na BR 349 (12 km de Correntina)

Por causa disso, fizeram assembléia e decretaram a expulsão da estrada. Resolveram que nunca mais ela passaria nas ruas e nem cruzaria as suas esquinas. Por fim, unânimes, declararam-na “persona non grata!” Expulsa e enxotada, como uma filha deserdada de casa, agora chamaram até a polícia para vigiar.

Texto de Antonio Rocha.

8 COMENTÁRIOS

  1. A BR 349 precisa de acostamento, já que duplica-la não está nos planos do Governo, já que em breve será inaugurado o trecho da BR 030 entre Cocos- Ba até a BR 020, que encurtara a distância entre o médio sertão, sudoeste e litoral da Bahia até a região centro-oeste. Com isso a BR 349 vai ver diminuir o fluxo de veículos.

  2. Parabéns meu amigo Antônio por essa bela materia, relembrando-nos aquela época sofrida mas maravilhosa, principalmente quando chegavamos na Velha da galinha pra saborearmos aquele frango com arroz divino…👏🏻👏🏻👏🏻

  3. A jardineira da foto acima, identificada por viação Correntina carro prefixo 40, deve ter sido no tempo dos Badecos, no final da década de 1950, durou pouco, continuaram com caminhões, no final da década de 1960 surgiram com a Viação Badeco,até passar para o Expresso São Luiz; Na década de 1990, veio a íngua da Novo Horizonte.
    A Viação Alto Paraiso veio em1.993, depois Real Expresso,1996, que também fizeram história na BR 349 até o Real Expresso ser encampado pelo Grupo Guanabara.

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