Publicado em 6/8/2025, às 07h33.

JONAS DE SEU DIDI, O DOUTOR DOS POBRES.
Por Antonio Rocha.


Dando sequência ao resgate dos personagens negligenciados de Correntina, trago ao conhecimento do leitor uma das figuras mais humanas que a região já teve. Seu nome completo é Jonas Pereira do Nascimento, conhecido por Jonas de seu Didi. Tratava-se de uma pessoa que nasceu com a vocação de servir. Embora destituído do domínio técnico, parecia ser dotado da predisposição, do desejo e de certa expertise empírica e intuitiva para a medicina. Seu encanto pela vida e pelos desafios da anatomia humana era notável. Sua dedicação à cura das enfermidades e ao arrefecimento do sofrimento, sua empatia e empenho pelo restabelecimento da saúde dos doentes era admirável. O destino, ou melhor, a injusta situação socioeconômica do país, e do município em particular, não permitiu que Jonas alçasse vôos mais altos.


De família humilde e numerosa, condições financeiras limitadas, o jovem filho do casal Didi e Maria foi impedido de realizar o sonho de cursar medicina. Restou-lhe contentar-se com um simples curso técnico de enfermagem e estudos extensivos, tornando-se autodidata na área. Mas isto não o impediu de minorar a situação dos carentes, tanto da cidade como do campo. Contingente de pessoas, com pouco ou nenhum dinheiro, recorriam a ele, que os acolhia e dispensava-lhes os cuidados possíveis. Comumente acolhia as pessoas em sua própria casa, quando impossibilitado de ir às residências dos pacientes.




Num contexto de dramática estrutura médico-hospitalar e o acesso aos recursos de fora era extremamente difícil, surgiu essa boa alma para socorrer aquela essa gente. Jonas foi um peregrino da saúde, um altruísta idealista que abdicou de tudo, inclusive de constituir família. Dedicou-se quase que de modo sacerdotal, não somente aos seus velhos pais, mas à população pobre do município. E o fazia como em resposta a um chamado do alto, para a missão de cura na terra. Amigo de todos os momentos, religioso, cultivador de boas amizades, despojado e simples, procurava ocupar-se e estar sempre com as pessoas. Quase um místico, costumava estar bem vestido, impecavelmente alinhado, dos pés à cabeça. Elegantemente, para suas diligências, atendendo os pacientes nas respectivas residências.



Além disso, Jonas tinha um flex de historiador, e possuía uma privilegiada memória de Correntina. Sabia e contava narrativas da cidade, de suas tradições, das raízes da fé cristã de tradição católica e evangélica. Conhecia as linhagens familiares das oligarquias do município, dava conta de quem nasceu e de quem morreu. Era um atento observador, não só das doenças e achaques que acometiam os humanos, pois era autêntico observador social. Conhecia perfeitamente as tramas políticas, os enredos do mundo eclesiástico e das famílias de destaque da cidade, além de outras minúcias. Porém era discreto e não soltava a língua facilmente com qualquer um. Quando, eventualmente indagado por alguém acerca de algum assunto sensível, desconversava e respondia que não sabia, alegando ser um homem muito ocupado e sem tempo. Jonas era muito discreto, mas costumava entabular conversas amistosas e prazerosas com pessoas de qualquer nível, sem exceção. Após a missa noturna na matriz, costumava conversar com amigos na praça, até altas horas. Outro ponto de encontro que Jonas costumava frequentar, depois do atendimento aos doentes, era a esquina de sua casa, onde geralmente acolhia os transeuntes, para o exercício da prosa. Conversava de olhos fechados como, se meditando estivesse, mas quando interceptado, afirmava estar a meditar.