Publicado em 19/11/2025, às 15h10.

Antonio Rocha.
Possui graduação em Filosofia pela PUC Goiás, graduação em Direito, Licenciatura em História, Curso Seminarístico de Filosofia pelo Instituto de Filosofia/teologia de Goiás, Curso livre em Teologia (1993), especialização em Filosofia Clínica, e mestrado em Ciências da Religião pela PUC Goiás. Ex- Professor efetivo da PUC Goiá6ys, foi professor convidado do Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás.

ROSINHA CUBÚ, A PRETA QUE NUNCA ACEITOU SER SEGREGADA @

A propósito desta semana, inserida em nosso calendário como da consciência negra, deliberei-me destacar a narrativa sobre uma expressão humana, popularmente chamada de Rosinha Cubú. Rosa não era qualquer pessoa, não obstante os incontáveis motivos para ser ignorada e jazer no anonimato. Mulher de cor, pobre e solteira, cuja moradia era de chão batido e paredes de adobe combinado com taipas. Seu meio de sobrevivência era igual o de toda família pobre de Correntina que, em sua maioria, vivia de coletar lenha no mato, além de cozinhar, lavar e passar roupas para os outros. Mas, afinal, o que levou essa senhora a romper a muralha da exclusão social de sua época? A indagação é pertinente porque, embora o índice de analfabetismo dos anos 60 fosse elevadíssimo, principalmente no universo feminino, Rosinha foi capaz de superar muitos desafios de seu tempo. E o fez devido à sua habilidosa capacidade de ler, assim como a de escrever com reconhecida desenvoltura, razão pela qual era designada a fazer leituras na igreja, instruir os jovens e treinar as crianças na relação com os livros.  Ela figurava-se entre as pessoas bem informadas sobre assuntos religiosos e laicos.

Além de familiarizada com o mundo das letras e da educação, Rosinha deixava transparecer profunda sensibilidade humana, consubstanciada em seu efetivo altruísmo. Mesmo dispondo de minguados recursos, foi capaz de adotar, sustentar e alfabetizar inúmeras crianças pobres. Um caso típico e ilustrativo de sua personalidade foi a adoção de uma menina portadora de severas limitações cognitivas e, cuja mãe padecia de grave deficiência mental. Rosinha Cubú assumiu essa criança e tornou-se uma espécie de educadora sua, desincumbindo-se de tal obrigação somente quando partiu para a eternidade.

Foto de “Uma Um” a criança adulta cuidada por Rosinha Cubú.
Foto de “Um a Um” a criança adulta cuidada por Rosinha Cubú.

Já na condição de viúva, residente à Rua Felix de Araújo, nossa homenageada completava sua renda familiar escrevendo e lendo cartas, comentando manchetes de jornal e interpretando os livros para os vizinhos e quaisquer curiosos. Numa época em que quase 90% da cidade era analfabeta, ler e escrever constituía-se num privilégio, o que capacitou Rosinha a conquistar autonomia e tornar-se uma mulher empoderada, cidadã integrada à escolarizada elite de Correntina.

Foto da casa onde residiu Rosinha Cubú.

Perceptivelmente a nossa personagem tinha um histórico familiar marcado pela vulnerabilidade social, e tal constatação induz-me a concluir que ela chegou tão longe por predisposição e méritos próprios. Sua altivez e livre trânsito na alta roda social evidenciam a predisposição natural que a transformou numa líder. Era uma preta bem articulada, falante, desinibida e extremamente querida. Detentora de inconfundível bom humor, costumava dialogar olhando nos olhos das pessoas. Inequivocamente, Rosinha jamais deixou de andar com seus pares, suas vizinhas de rua, de reza e de luta.

Foto de Rosinha Cubú.

Católica praticante, Cubú rezava todas as novenas, erguia todos os mastros de santos, rezava em todos os velórios, encomendava todas as almas, além de benzer contra todos os males e achaques. Que alma boa! Das lapinhas aos reisados, do divino à padroeira, Rosinha não perdia a ocasião. Por conta de todas essas qualidades, tornou-se depositária das memórias históricas da cidade e, consequentemente, requisitada por estudiosos pesquisadores.

 

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