Publicado em 17/9/2025, às 10h36.

Joselita Neves de Moura – Professora da rede pública de educação de Correntina.
Foto divulgação/Joselita Neves.

Em Correntina habita um povo cigano, uma etnia vibrante e repleta de história.
Por Joselita Neves.

Este texto se inicia com uma sincera homenagem à Secretaria Municipal de Educação de Correntina, que proporcionou, neste ano, um espaço para a celebração do povo cigano durante o desfile. Contudo, lamento que tenham sido apresentados como Religião. Os ciganos são muito mais que isso; eles são portadores de uma identidade marcante, frequentemente marcada pelo preconceito e pela invisibilidade, conceitos que aprofundaremos adiante. É importante frisar a relevância dessa iniciativa, que, conforme pesquisa, se deu apenas em dois dos 417 municípios do nosso estado: Correntina e Jacobina.

Em Correntina, há mais de quatro décadas, famílias ciganas elegeram esta terra para chamar de lar, estabelecendo-se, aqui. Contudo, suas raízes remontam a tempos ainda mais distantes. Quem nunca ouviu, com um misto de admiração e estranhamento, os mais velhos narrando as histórias de mágicas caravanas de ciganos, que se alojavam nos povoados, nas fazendas e nas proximidades da cidade? Contudo, junto a essas histórias, também vieram os preconceitos: estereótipos de que os ciganos são ladrões, trapaceiros, ou até, seqüestradores de crianças. É bom lembrar que entre nós também encontramos pessoas com comportamentos questionáveis. Faço minhas as palavras da querida Simone Mendes: “Gente boa e má tem em todo lugar”.

Foto divulgação/Joselita.
Foto divulgação/Joselita.
Foto divulgação/Joselita Neves.

 

Uma marca desse legado é o cemitério que ostenta o nome de CEMITÉRIO DA CIGANA. Mas quem foi essa cigana? Por que sua identidade permanece envolta em mistério?

Foto divulgação/Joselita Neves.

Os ciganos que moram em Correntina são da etnia Calon, organizados em clãs (famílias). Os Calons chegaram ao Brasil juntamente com os colonizadores e se espalharam pelo Nordeste e Sudeste. No Brasil, igualmente, encontram-se os ciganos Sinti, que habitam a parte sul do país, e os Rons, cuja maior comunidade reside em Souza, na Paraíba.

Foto divulgação/Joselita Neves.

Sempre nos questionamos: por que uma cultura tão rica, colorida e jubilante parece ter sido esquecida? Foi silenciada? Será que os ciganos que se estabelecem em nossa sociedade o fazem para superar os estigmas e preconceitos que lhes são atribuídos? Comprometo-me a investigar essa questão.

Ao observamos a sociedade correntinense, notamos que são raras as mulheres que ainda circulam pelas nossas ruas, adornadas com suas lindas vestes coloridas. Muitas delas, até pouco tempo atrás, sentiam vergonha de seus trajes, negando assim a sua própria cultura. E os homens? Recordo-me vividamente do Cigano Correia, com seu chapéu elegante, botas longas e um cinto adornado com uma fivela grande. E me questiono: Onde estão os “Correias” de hoje?

Foto divulgação/Joselita Neves.

Esse povo é um símbolo de resistência, lutando incansavelmente pelo seu reconhecimento, clamando para que possamos enxergá-los. Entretanto, é preciso ressaltar que algumas mudanças começam a surgir: em Correntina, há aqueles que valorizam e lutam por eles. Um exemplo notável é o ex-vereador Lourival Miranda, autor do projeto que instituiu o dia 24 de maio como o Dia Municipal do Cigano, o ex prefeito Maguila que sem questionar sancionou a lei sendo essa uma conquista feita com fervor, mas que enfrentou barreiras.

Foto divulgação/Joselita Neves.

No Brasil, sob a liderança do Presidente Lula, está sendo realizado um mapeamento do povo cigano, e essa pesquisa já aconteceu em Correntina. Foi aprovado o Plano Nacional de Políticas Públicas para essa população. No governo da Bahia, existe uma coordenação na Secretaria de Cultura dedicada às populações identitárias, que também teve a atenção voltada para Correntina, reconhecendo a força e bravura do nosso povo, exemplificado pela matriarca Dona Enedina Mendes a quem rendemos homenagens. Essa mulher possui um acervo de histórias valiosas para compartilhar, narrativas que traremos à luz em futuras edições deste jornal.

E, recentemente, ocorreu em Salvador, a CONFERÊNCIA ESTADUAL DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL, nos dias 20, 21 e 22 de agosto, onde as dignas representantes Simone Mendes e Marizete Oliveira estiveram presentes, defendendo seu povo e as comunidades identitárias do nosso território.
Que possamos entender que a ciganidade não se restringe a uma religião, mas sim a uma ancestralidade rica, a uma força de uma etnia vibrante que necessita de reparação social, tal como os afrodescendentes e os povos originários.

Foto divulgação/Joselita Neves.

A contribuição do povo cigano para a construção do Brasil merece ser devidamente reconhecida, seja na música, na alegria, na gastronomia ou em outras facetas culturais.

Recentemente, Correntina celebrou a sua primeira festa literária dedicada à cultura e manifestações dos povos ciganos, e muitos perderam a oportunidade de desvendar essa rica herança cultural. O conhecimento é a chave para desmantelar o preconceito. Existe um ditado popular que destaca que só amamos aquilo que conhecemos; é preciso conhecer para não discriminar.

Viva o povo cigano!

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