Publicada em 05/06/2024 às 22h22
Minha opinião sobre a PEC da privatização das praias.
“Praia é lugar onde rico tem que aguentar pobre, e isso incomoda muito” Leonardo Sakamoto, colunista do UOL.
Inicio este artigo com a frase do Sakamoto, porque ela traduz o que eu sinto diante da tramitação da denominada “PEC das praias” no Senado Federal.
E embora eu esteja aqui em Correntina, a uns mil quilômetros da beira mar, acho que o assunto é pertinente, porque diz respeito a todo o país. E como residi por cerca de três décadas – em dois períodos – no sul e extremo sul baiano, conheço bem esse tema.
Em verdade, boa parte do litoral brasileiro já está praticamente privatizado, com grandes empreendimentos ocupando faixas significativas do nosso litoral. E para ilustrar, vou citar aqui um pouco do que conheço e ocorre na região da denominada de Costa do Descobrimento, em especial, na orla dos municípios de Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália.
Na orla norte de Porto Seguro, por exemplo, a faixa de areia localizada entre os grandes centros de lazer, como Tô a Toa e Axé Moi e o mar, não pode ser utilizada por pessoas que não sejam consumindo naqueles estabelecimentos. Ou seja: funcionários dos dois estabelecimentos impedem que os não clientes [daqueles estabelecimentos] ocupem aquela faixa de areia.
Na povoação de Santo André, no município de Santa Cruz Cabrália, diversos empreendimentos, entre eles vários condomínios residenciais e o hoje hotel em que foi transformado o prédio que abrigou a Seleção de Futebol da Alemanha na copar realizada aqui no nosso país, praticamente impedem o acesso à praia. Toda a frente da povoação [para o mar] está ocupada por esses empreendimentos. Restando aos nativos e turistas que não têm poder aquisitivo para se hospedar nos hotéis chiques, caros, apenas um corredorzinho de uns dois metros de largura, que permite o acesso à faixa de areia e ao mar.
Há muitos outros casos que eu poderia citar aqui. Mas, não vou ser prolixo.
Nesses casos citados, o que o leitor crê que vai acontecer se a PEC for aprovada? A minha certeza é de que vão cercar essas áreas, os pobres que procurem outro lugar para o seu lazer. Ora, bolas… pobre junto dos ricos? Onde já se viu isso? Só na praia…
O argumento dos interessados na aprovação da PEC é de que não há como privatizar as praias, e citam algumas das mais importantes praias brasileiras como impossíveis de serem privatizadas; isso, como uma cortina de fumaça, para ocultar os seus verdadeiros interesses. Mas a verdade é que, assim como na Costa do Descobrimento, há milhares de quilômetros de faixas de areias, com lindas praias, algumas quase intocáveis, que existem no nosso litoral, e são utilizadas por pequenas comunidades, que, em sendo aprovada essa PEC, terão o acesso fechado para as populações locais.
Conheço bem essa situação, que já ocorre hoje. Até porque, sendo Corretor de Imóveis, já acompanhei casos assim; disputas na Justiça. Há casos, em as populações locais só têm direito a utilizar as praias porque a Justiça determinou aos donos dos empreendimentos, permitir aos moradores passar por dentro da área privativa.
Essa é a realidade que conheço, aqui na Bahia, e não é diferente do restante do nosso país.
*Teoney Araújo Guerra é jornalista provisionado e escritor.