Publicado em 18/04/2025 às 07h07.

Cena do lava-pés. Grupo Judac da Paróquia de Correntina-Ba.

DOS PÉS AO CORAÇÃO, NO JANTAR DA QUINTA-FEIRA.
Por Antonio Rocha.

O Rito da Quinta-Feira Santa sempre me chamou atenção. Gosto de ver o pão, a mesa, o vinho, a toalha e todo o cenáculo iluminado, bem como o jantar, os convivas e a higienização para a Ceia Sagrada. Tudo me envolve e me causa encantamento. É que primeiro observo, examino e só depois rezo. Rezo a lição que aprendi…

Todavia, nessa Quinta-Feira, rezei diferente. Foi logo depois que vi Jesus se agachar e com toalha e jarra nas mãos lavar os pés dos galileus. Então exclamei: logo os pés! Não há outra parte mais nobre do corpo a ser tocada, lavada e osculada?  Com espanto, virei-me para os fiéis da igreja, imaginando que o meu grito interno teria sido ouvido por todos ali presentes. E Jesus prosseguia lavando, beijando e abraçando os seus, começando pelos pés até o coração dos discípulos, unindo o Seu Coração ao deles.

Foto: Cena da cura do cego. Grupo Judac da paróquia de Correntina-Ba.

Continuei me perguntando: por que os pés? Eles são uma das partes do corpo mais negligenciadas, descuidadas, ignoradas e invisíveis. Sim, porisso mesmo! Certamente, diria Jesus a mim: verdade seja dita, pois, são eles, os pés, que amassam o barro, macera a uva e nos leva aos trigais para a feitura do pão para se unir ao vinho bom. São os pés que nos conduzem ao trabalho, à lida e ao lazer, no entanto, são tão poucos lembrados por nós.

Eu não havia me atentado, ainda, ao fato de que é para as partes nobres do corpo que a nossa atenção mais se volta. São elas que recebem, preferencialmente, os nossos afagos, a boa massagem, o bom perfume e os nossos afetos. Enquanto os pés, não obstante o seu silencioso trabalho e a sua invisível função, são, por nós, injustamente, esquecidos. Por isso foram eles o objeto da escolha de Jesus, no serviço da Santa Ceia. A eles, Jesus dedicou toda a sua atenção. Lavou-os e os beijou, recomendando aos seus que fizessem o mesmo. Presenciei, naquele momento, uma lição de coerência a toda prova!

Rezando, voltei a me perguntar: por que Jesus quis terminar o seu ministério com aquele gesto? Para mim, uma resposta possível é que o Filho do Homem desejara iniciar o seu ministério a partir dos esquecidos e dos abandonados, aqueles sobre os quais os nossos olhos, comumente, não repousam! Sabiamente, Jesus quis privilegiar os que são por nós desprezados. Confirma-se, assim, que os pobres são os pés da sociedade!

Percebe-se que os pés são mesmos as últimas partes do nosso corpo. Lavar os pés de alguém é se submeter ao duro e humilde exercício de se curvar e descer até se tornar menor para o ofício do Sagrado Serviço. É ir ao encontro dos últimos, dos derradeiros, tratando-os com a mesma dignidade dispensada aos grandes do mundo.

Concluindo, eis aqui a grande força simbólica usada por Jesus: uma superação das palavras pela coerência da prática de vida. Aqueles pés não eram apenas pés que por si só são poucos vistos. Eram pés de pobres e de anônimos; de pescadores e de camponeses; pés dos pecadores desse mundo. Portanto, lavar os pés do próximo é se esvaziar de si mesmo, preenchendo-se do amor de Deus!

Antonio Rocha.
ANTÔNIO ROCHA: Graduação em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Curso livre em Teologia, especialização em Filosofia Clínica, pelo Instituto Packter e mestrado em Ciências da Religião pela PUC Goiás.

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