Publicado em 28/11/2025, às 14h20.

JOÃO CARCEREIRO, O DONO DAS CHAVES DA CADEIA DE CORRENTINA
Por Antonio Rocha.

Joãozinho carcereiro. Este era o nome conhecido na cidade e temido pelos descumpridores da lei e da ordem. O homenageado neste ensaio era um homem de porte físico mediano, esbelto, ágil. De olhar profundo e pulso firme, sabia desenvolver uma boa prosa. Funcionário público responsável pela única carceragem municipal, um agente de segurança atento, diligente e “pau para toda obra.” Sua predisposição para tão exigente prerrogativa o fez homem de múltiplas funções, a ponto de ensejar certa confusão sobre suas atribuições.

Ocorre que Joãozinho carcereiro, equivocadamente, às vezes desempenhava funções de polícia, de oficial de justiça ou mesmo de delegado. Agia como uma espécie de defensor e arauto da moral e dos bons costumes. Percorria a cidade inteira, sobretudo os locais mais suscetíveis à disseminação da obscenidade. O fazia com o ânimo de fiscalizar, repreender e, quando necessário, intimidar ou intimar os eventuais transgressores da lei. Não se sabe, ao certo, se ele atuava sob o balizamento do antigo código do Major, ou se com base numa legislação moderna. Mas recordo-me de quando uma autoridade local proibiu as pessoas de tomarem banho nuas, no banheiro masculino, a céu aberto, próximo ao Remansão.

Percebe-se que tão somente a rocha, denominada de lajedo, servia como parede deste banheiro natural. Ao longo de muitos anos, habitualmente os homens dirigiam-se para lá, portando toalhas e saboneteiras, nos períodos matutino e noturno. Jamais homem algum havia sofrido qualquer sanção ou impedimento, até que um novo juiz da cidade determinasse o fim daquele costume. A partir da decisão judicial, os homens resolveram traçar uma estratégia e montaram uma espécie de vigilância nos horários do banho. Alternadamente, enquanto uns tomavam banho, outros ficavam como olheiros, vigiando os paços do carcereiro.

Porém, para o azar de alguns, num dia qualquer, daqueles em que o urubu debaixo suja o de cima, o Carcereiro estrategicamente flagrou uns adolescentes tomando banho tais como vieram ao mundo. Imediatamente os intimou a comparecer à delegacia, acusados de atentado ao pudor. Perplexidade geral! A saída foi as mães dos infelizes advogarem em favor dos próprios filhos, implorando ao delegado para não prender os adolescentes.

Apesar da conhecida dureza, João Carcereiro tinha lá seus atributos de sensibilidade. Na condição de católico fervoroso, frequentador de missas e outros eventos religiosos, essas pendengas de menor potencial ofensivo ele resolvia e descartava o encarceramento. Tudo leva a crer que, no fundo, aqueles arroubos eram motivados por suas ambições de poder.

Em última instância, Joãozinho Carcereiro aspirava ao posto de Delegado, senão uma posição superior. Essa pretensão era notória e evidente, explicitada em ações e atitudes. Deixava transparecer que, caso seu pleito fosse mal sucedido, contentaria em figurar-se como Rei, desfilando de coroa na cabeça e bastão nas mãos, por ocasião dos festejos em Correntina. Não obstante, seu João Carcereiro era um homem correto, de bons princípios, honrado pai de família e um agente público exemplar, cujo propósito era o melhor exercício de sua função. Em razão disso, tornou-se o homem da mais inteira confiança do Monsenhor André, nas trilhas intrincadas do nosso sertão.





